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segunda-feira, 14 de março de 2011

Puxador da avalanche

O rei, da Sapucaí, é ele (foto: divulgação)

De Curitiba

O enredo campeão do carnaval do Rio de Janeiro falou sobre Roberto Carlos.

Mas o Rei da Sapucaí é Neguinho da Beija-Flor, com sua princesa nilopolitana.

Jamelão, o maior deles, não gostava de ser chamado de puxador de samba. "Sou intérprete", dizia.

Talvez porque entendesse a palavra com um significado menor.

Porque, mais do que cantar, o intérprete do samba precisa puxar mesmo. Puxar os componentes para a apoteose, puxar o público para a avenida.

Puxar a escola para a vitória.

Neguinho da Beija-Flor é assim: ele não só interpreta, com o maestria, o samba. Ele conduz, ele puxa a galera de Nilópolis com ele, uma avalanche na avenida.

Conversando com os nilopolitanos, ansiosos à espera de ver sua escola passar, a gente percebe no brilho dos olhos o orgulho em ser de Nilópolis.

Dos mais pobres municípios da Baixada Fluminense, Nilópolis não tem a refinaria como Caxias, nem as belezas da natureza de Niterói. "Tem Beija-Flor", bate no peito o povo de lá.

Não é à toa que a escola é a campeoníssima, sobretudo nos últimos dez anos.

Uns, por desconhecer a história recente dos desfiles, outros, talvez ressentidos por não verem a escola preferida com o título, tentaram minimizar a conquista da Beija-Flor neste ano.

Alegam que foi favorecida pelo tema do enredo, Roberto Carlos, de forte apelo comercial, artista contratado da Globo.

Ignoram - repita-se, por desconhecimento ou por ressentimento - que a Beija-Flor, os títulos dela mostram, nunca precisou desse tipo de artifício para ser percebida.

Pelo contrário.

Os títulos da escola de dez anos para cá foram obtidos com enredos e sambas nada comerciais, e concorrendo com escolas que priorizaram atores, dançarinos e globais do BBB, em vez da comunidade.

Relembremos:

- Em 2003, a Beija-Flor foi campeã com um enredo que falava das revoltas e mobilizações populares, inclusive as da história do Brasil. Dizia um refrão do samba:

"Grito forte dos Palmares, Zumbi
Herói da Inconfidência, Tiradentes
Nas caatingas do Nordeste, Lampião
Todos lutaram contra a força da opressão"

No final, denunciava a concentração de renda no Brasil:

"Chega de ganhar tão pouco, tô no sufoco, vou desabafar:
'Parem com essa ganância, pois a tolerância pode se acabar"

- No ano seguinte, 2004, um enredo que abordou a Amazônia fugindo do lugar comum de se enaltecer as belezas naturais e riquezas naturais da floresta. Enfatizou as lendas indígenas e caboclas dos povos que habitam a região.

- Em 2005, o tricampeonato, falando sobre as missões jesuíticas e a cultura guarani, com um belo samba carregado de expressões indígenas, nada convencional, portanto. O refrão:

"Na liberdade dos campos e aldeias
Em lua cheia canto e danço o guarani
Com Tubichá e o feitiço de Crué
Na Yvy Maraiê, aiê... povo de fé"

- Outro belo hino, em 2007, foi fundamental para mais um título. O enredo falava da África como berço da nossa cultura popular, heranças que resistiram à opressão - imposta pela exploração da mão-de-obra escrava - do colonizador europeu. O refrão, nada "comercial":

"É Jeje, é Jeje, querebetã
A luz que vem de Daomé, reino de Dan
Arte e cultura, Casa da Mina
Quanta bravura, negra divina"

- Em 2008, último título até a conquista agora em 2011, um enredo sobre Macapá a partir da mescla entre lendas indígenas dos povos nativos e geografia, geologia e astronomia.

"Quem foi, meu Deus, que fez do barro poema?
Quem fez meu criador se orgulhar?
Os Cunanis, Aristés, Maracás
foram dez foram mais, pelo Amapá"

Para 2012, a ideia é um enredo sobre Angola. Com uma sempre inspirada ala de compositores e Neguinho para para puxar, desde já, Beija-Flor favorita a mais uma conquista, podem se preparar.

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