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sábado, 30 de julho de 2011

Só se escuta o silêncio

Onde está aquela gente que libertou os escravos e resistiu à repressão? (foto: WAA)

De Curitiba

É doído reconhecer, mas os 20 anos de ditadura - 1964-1984 - conseguiram o que queriam: aniquilar a capacidade de Santos e seu povo se rebelarem.

Da vanguarda na luta abolicionista do século XIX, das mobilizações populares por água e saneamento do início do século XX, do "Porto Vermelho" ou "Moscou brasileira" de meados do século passado parece só ter restado a memória.

Nesta semana, o Tribunal de Justiça de São Paulo ouviu, na capital, testemunhas da tortura e assassinato de um dos lutadores filhos de Santos, o jornalista Luiz Eduardo Merlino, morto há 40 anos, em 19 de julho de 1971, nas dependências do DOI-Codi. (Saiba mais AQUI)

Não se teve notícia de nenhuma manifestação na cidade. Nenhuma linha na imprensa local. Não se ouviu uma voz de qualquer militante.

Onde está aquela gente que afrontou as leis imperiais e libertou os escravos? Aquela gente que fez valer na marra o direito a água e esgoto em casa e a bonde na rua? Onde estão os sindicatos que fizeram coro ao "Petróleo é Nosso" e se rebelaram diante do golpe militar?

A repressão foi drástica em Santos. Lideranças políticas foram cassadas, trabalhadores, movimentos sociais e seus militantes perseguidos. Um navio no porto, o Raúl Soares, serviu de cadeia. A cidade foi decretada área de segurança nacional e foi a última a ter sua autonomia político-administrativa re-estabelecida, só em 1984.

Hoje, o que se escuta é o silêncio, o que se vê é a cegueira, o que se sente é a complacência diante dos desmandos, das desigualdades, das injustiças, da exploração predatória da empresa de ônibus e das empreiteiras dos serviços e obras públicas, das promessas demagógicas e vãs dos governantes. E  a complacência diante dessa própria dormência.

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Em defesa do Elano

Dos pés dele saíram passes e gols fundamentais nos últimos anos (foto: Santos F.C.)
De Curitiba
Que os torcedores dos outros clubes cornetem, até se entende.

Falar a verdade, soa dor-de-cotovelo: bem que gostariam de ter um Elano no time.

Agora, crucificação partindo de santistas, aí é injustiça.

Elano foi peça-chave nas principais conquistas do Santos na década atual.

Os campeonatos brasileiros de 2002 e 2004. A briosa campanha que levou ao vice da Libertadores em 2003.

O tri da Libertadores, deste ano.

Elano foi artilheiro do Campeonato Paulista. E um dos poucos jogadores que se salvaram na desastrosa participação da seleção brasileira na Copa do Mundo, um ano atrás.

Ontem, a precisa assistência ao Borges, que resultou no primeiro gol do Santos contra o Flamengo, partiu dos pés de Elano.

No segundo tempo, no comecinho, quase faz um golaço de falta - mérito do goleiro adversário, Felipe, que espalmou a bola.

Se a cavadinha de Elano tivesse entrado, este post não estaria sendo escrito.

Porque comentaristas e corneteiros de plantão estariam a exaltar a ousadia do jogador, que teria se redimido do pênalti perdido na Copa América, não só pela cavadinha, mas pelo passe magistral ao Borges; ele, Elano, exemplar na Copa do Mundo, imprescindível no tri santista da Libertadores, a experiência a serviço do ímpeto da mais nova geração de Meninos da Vila etc etc etc.

Não é por apenas um gesto, um ato, que se julga - e se condena ou se absolve - um ser humano.

A trajetória de Elano, no Santos e na seleção, é merecedora de, no mínimo, respeito.

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Vendem até nossa saúde

Parece mentira, mas é verdade (ilustração: SindSaúde-SP)
De Curitiba

Que essa moda paulista não pegue.

O Ministério Público do Estado de São Paulo já foi acionado e tomara aja exemplarmente.

Porque o que o "xoque de jestão" tucano está fazendo com a saúde pública...

Primeiro, terceirizou os hospitais e ambulatórios médicos de especialidades para as famigeradas organizações sociais de saúde (OSS).

Privatização disfarçada, privataria.

Pois a maior parte dessas organizações parece não ter nada de sociais.

Ao contrário das Santas Casas, Beneficências Portuguesas, que têm um histórico de dedicação à filantropia, essas tais OSS assumem unidades construídas pelo Estado, com dinheiro do povo, para administrar e receber por isso, como prestadores particulares de serviços, e não organizações sociais, filantrópicas.

Segundo denúncia do Vi o Mundo, a qual gerou a reação do Ministério Público, o Estado de São Paulo acumula rombo de R$ 147 milhões por conta desses repasses às ditas OSS.

Barbaridade!

Só que tem mais: no início deste mês, o governador Geraldo Alckmin assinou decreto "vendendo" 25% dos leitos dos hospitais públicos para planos de saúde.

Privatização escancarada, privataria.

CLIQUE AQUI e confira a série de matérias que o Vi o Mundo tem publicado sobre o assunto.

domingo, 24 de julho de 2011

Floripa no caminho de Sampa

 O que resta de mata está sendo derrubado para dar passagem a carros (foto: Deinfra-SC)

De Curitiba

Florianópolis está incorrendo no mesmo caminho de São Paulo.

Desastroso caminho.

Quem conhece a capital catarinense sabe o quão dificultuoso é se deslocar pela cidade.

O transporte coletivo, apesar das exitosas reformulações dos últimos anos, é caro e ineficiente.

As vias, em maior parte, são estreitas, tortuosas, imprensadas no relevo acidentado da ilha.

A cidade está crescendo, está na moda, cada vez mais atraindo turistas.

O poder público - em todas as esferas, porque as obras vêm sendo tocadas pela Prefeitura, Estado e União - tem procurado solucionar os problemas de modalidade.

No entanto, de forma irreversivelmente equivocada, porque o faz com intervenções que privilegiam o automóvel, o transporte individual. Assim como, 40 anos atrás São Paulo avançou sobre as marginais dos rios, aterrou e canalizou córregos para abrir avenidas para carros, Florianópolis está rasgando a mata atlântica dos seus morros para expandir suas vias, mas preferencialmente para os carros.

Por que, em vez de duplicar, como tem feito, as rodovias que ligam o Centro ao Aeroporto, o Centro ao Sul da ilha, o Centro ao Norte da ilha, Florianópolis não destina projetos e recursos para obras de implantação de um metrô de superfície, unindo os quatro extremos do território? No lugar do asfalto para carros, por que o alargamento das vias em curso não seja destinado a faixas exclusivas de ônibus?

O poder público está errando na opção. A sociedade, ao que parece, não percebe, ou pouco se mexe.

terça-feira, 19 de julho de 2011

Radicalizar é lógico

 Refém dos interesses privados, transporte não será coletivo. (foto: PMS)

De Santos

Radicalizar.

Radicalizar não significa agir de forma irresponsavelmente extrema.

Radicalizar é ir à raíz.

Os gestores do trânsito de Santos precisam radicalizar.

Ir ao xis das questões.

As intervenções recentes que a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET-Santos) vêm tomando são bem intencionadas.

Até solucionam problemas locais, pontuais, sazonais.

É a proibição de estacionamento aqui e ali, twitter para informar sobre as condições de circulação, minirrotatórias em cruzamentos conflituosos, campanha para o respeito à faixa de pedestres...

Mas são paliativas, e portanto insuficientes, porque não são radicais.

Não atingem a raíz.

Em vez, por exemplo, das momentâneas faixas preferenciais para ônibus na Conselheiro Nébias e na Ana Costa, a CET deveria implantar faixas exclusivas durante o dia todo.

E não só nessas avenidas, como também na Afonso Pena, na Francisco Glicério, na Nossa Senhora de Fátima, na Martins Fontes...

Os corredores, todavia, ainda não chegam à raíz mais profunda.

Faixa exclusiva para esses ônibus que estão aí adiantam nada.

Enquanto o transporte coletivo for refém dos interesses do monopólio privado, o sistema de ônibus não se atualiza, não avança - não atende aos interesses da coletividade.

Os itinerários precisam ser reformulados, a frota ampliada e modernizada, os intervalos diminuídos.

É o transporte público eficiente que vai eliminar congestionamentos, minimizar o estresse e assim reduzir batidas, atropelamentos na ou fora da faixa, acidentes em geral.

Transporte público eficiente é segurança no trânsito, é mobilidade urbana, é qualidade de vida nas cidades.

Parece o óbvio - e é.

Mas agir com lógica é romper com uma lógica posta e, lógico, é ilógico.

domingo, 17 de julho de 2011

Direito ao mar

Uma multidão não tem a chance de ver o mar, sequer uma vez na vida 
 De Santos

Sabe-se lá se existe essa estatística, mas certamente dos bilhões de moradores do planeta muitos não tiveram, não têm - e dificilmente terão - a oportunidade de conhecer o mar.

Imagina quem mora em Minas Gerais, no Tocantins, no Mato Grosso do Sul, no Paraguai, na Bolívia, no centro da África, na Mongólia, no interior da China, tão distante, sem um oceano assim ao alcance.

É uma injustiça com toda essa multidão. Estar a beira-mar, ao menos por um momento na vida, deveria ser direito humano - e a promoção ao acesso a esse direito, um dever de todos.

quarta-feira, 13 de julho de 2011

Sem opções para voar

Sonhado retorno da Transbrasil poderia trazer mais concorrência 

De Curitiba

Mesmo os mais liberais, neos ou velhos, devem concordar que será um absurdo se o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) corroborar a compra da Webjet pela Gol.

Se ela for efetivada, duas companhias – a Gol, que já é dona da Varig, e a Tam, que detém também a Pantanal – terão, sozinhas, mais de 80% do mercado de transporte aéreo de passageiros.

Praticamente um duopólio, nocivo a um setor importante para o restante da economia.

Agora, a julgar pelo histórico de privilégios do Grupo Constantino, do qual faz parte a Gol, a tendência é o Cade não se opor ao negócio.

A Gol surgiu – e cresceu – no vácuo da Transbrasil.

Enquanto da histórica companhia, em seus últimos tempos, exigia-se com rigor o cumprimento de obrigações, a Gol, dez anos atrás, ia conseguindo sem muitas dificuldades o direito de explorar rotas, de ocupar espaços em aeroportos...

Desde que recentes decisões judiciais consideraram que a alegada dívida que culminou com a falência da Transbrasil – supostos débitos de 22,5 milhões dolares à General Eletric – era inexistente e que, além disso, a empresa aérea teria direito a uma indenização de 190 milhões de dólares, reacendeu-se a esperança de renascimento da tradicional companhia.

Seria uma boa.

Primeiro, pelo ressurgimento de um patrimônio imaterial, a marca Transbrasil.

Segundo, e principalmente, porque diluíria o mercado.

quinta-feira, 7 de julho de 2011

As torres trigêmeas começam a subir

Unidade de exploração do pré-sal estão sendo erguidas no Valongo (foto: PMS)


De Curitiba

Desde as descobertas de petróleo na camada pré-sal na Bacia de Santos e, depois, com o anúncio da Petrobrás de que a cidade receberia a sede da unidade de negócios de exploração das reservas, Santos vive um boom de crescimento econômico comparável aos tempos do auge da exportação do café.

Pois as expectativas em torno do novo ciclo começam a tomar formas concretas.

Nesta semana, em concorrida solenidade, a Petrobrás começou a erguer a primeira das três torres do complexo que está instalando no Valongo, zona do porto antigo, no Centro Histórico.

A sede da Petrobrás vai mudar por completo o perfil das redondezas. Mais 2 mil pessoas, a serem empregadas na unidade, passarão a ter o Valongo como destino. As torres trigêmeas vão atrair, certamente, restaurantes e outros estabelecimentos de comércios e serviços.

(Não só as torres. Lembremo-nos de que a uma quadra dali estará o Museu Pelé, já em construção relativamente adiantada.)

Esperamos que, tal como tomada pela euforia está, a Prefeitura de Santos também esteja a planejar as intervenções necessárias para garantir a infraestrutura urbana adequada a área.

A começar pelas providências relativas ao trânsito. A Prefeitura deve incentivar o acesso à região por meio de transporte público, não por automóvel.

E não dá para ficar a se fiar na promessa do governo estadual de implantação do metrô leve, o sistema de Veículos Leves sobre Trilhos (VLT). Com VLT ou sem, a Prefeitura deve levar linhas de ônibus para a porta da Petrobrás e do Museu Pelé. Hoje, para se chegar ali de transporte coletivo desembarca-se muito longe: ou nas praças Mauá e Barão do Rio Branco ou, na melhor das hipóteses, no Terminal Deputado Rubens Paiva.

Não se tem, até agora, nenhum pronunciamento da administração municipal sobre projetos nesse sentido. Nem em outros.

sábado, 2 de julho de 2011

Carrefúcar e a Copa América

Oligopólio no varejo. Monopólio no futebol (foto: Pão de Açúcar)

De Curitiba

Se efetivada, a coligação entre Pão de Açúcar e Carrefour vai consolidar o oligopólio no varejo. Estaremos mais reféns ainda, como há muito estamos, dos interesses de poucos e grandes grupos controlando o comércio de produtos de primeira necessidade no país.

Será só mais um danoso oligopólio.

Temos o oligopólio na prestação de serviços de telecomunicações (telefonia e internet).

Oligopólio no transporte aéreo e no rodoviário - poucos e poderosas companhias ditando preços, regras, itinerários, destinos.

Temos o oligopólio na mídia.

E, dentro desse oligopólio, o monopólio na transmissão do futebol, um dos nossos patrimônios culturais.

A Copa América começou neste final de semana e a Globo, com exclusividade, é que vai transmitir os jogos da nossa seleção.

"Nossa", aliás, nem tanto - mais da Globo. Ela tem direito a entrar no quarto de jogador, a escolher quem vai ser estrela, a estabelecer coreografias de comemoração dos gols, a fomentar rivalidades toscas...

Quando se tentou impor o mínimo de limite a tanta ingerência, o técnico - Dunga - foi (continua sendo) retaliado.

Não se trata de má vontade com a emissora, nem ranço ideológico com a imperiosa organização.

Pelo contrário, a crítica aqui parte do ponto de vista da ideologia da qual a Globo é uma das defensoras: a da livre concorrência no mercado.

Que lhe se aplique também, ora pois.