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quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Ressaca, maré cheia… O mar avança sobre Santos e risco de perdas até o final do século é grande

Na Ponta da Praia, as evidências do avanço do mar

A inundação de áreas costeiras das zonas sudeste e noroeste de Santos, causada pela combinação da elevação do nível do mar com ressacas, marés meteorológicas e astronômicas e eventos climáticos extremos, pode causar prejuízos acumulados de quase R$ 2 bilhões até 2100 se não forem implementadas medidas de adaptação.


Por Elton Alisson, de Santos, da Agência Fapesp

A estimativa é de um estudo internacional, realizado por pesquisadores do Centro de Monitoramento de Desastres Naturais (Cemaden), dos Institutos Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e Geológico (IG) e das Universidades de São Paulo (USP) e Estadual de Campinas (Unicamp), em parceria com colegas da University of South Florida, dos Estados Unidos, do King’s College London, da Inglaterra, além de técnicos da Prefeitura Municipal de Santos.

O estudo faz parte do projeto “Uma estrutura integrada para analisar tomada de decisão local e capacidade adaptativa para mudança ambiental de grande escala: estudos de casos de comunidades no Brasil, Reino Unido e Estados Unidos”, apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), no âmbito de um acordo de cooperação com o Belmont Forum.

Os resultados do estudo foram apresentados em 30 de setembro último a representantes da sociedade civil de Santos.

Durante o encontro, os pesquisadores mostraram às lideranças locais projeções de elevação do nível do mar e de impactos econômicos até 2050 e 2100 nas regiões sudeste e noroeste de Santos – que já têm sido impactadas pelo aumento do nível do mar e atuação de eventos extremos – e discutiram possíveis medidas de adaptação para minimizar os riscos.

“Não é preciso esperar 20 ou 30 anos para sentir os efeitos da elevação do nível do mar. É possível implementar agora medidas de adaptação para minimizar os potenciais danos econômicos”, disse José Marengo, pesquisador titular do Cemaden e coordenador do projeto do lado do Brasil, à Agência Fapesp.

Os pesquisadores constataram por meio de dados sobre mudanças no nível do mar em Santos – obtidos por marégrafos na região no período entre 1945 e 1990 e por altimetria de satélite entre 1993 e 2013 –, que ele aumentou, em média, 3 milímetros nos últimos anos na cidade.

Com base nessa constatação, os pesquisadores estimaram que o nível do mar na cidade pode aumentar entre 18 e 30 centímetros até 2050 e entre 36 centímetros e 1 metro em 2100.

A combinação dessa elevação  com uma sobrelevação causada por uma ressaca forte (ondas elevadas e maré meteorológica) e numa fase de maré de sigízia (maré astronômica de maior amplitude, que ocorre durante as luas cheia e nova, quando o Sol e a Lua estão alinhados em relação à Terra e há maior atração gravitacional), pode resultar em um rápido aumento do nível do mar em Santos de 90 centímetros até 2050 e 95 cm até 2100.

Nessas condições, as regiões sudeste e noroeste de Santos seriam ainda mais inundadas pelo mar e haveria maior erosão da praia.

“A planície costeira de Santos apresenta declividades muito baixas [menores de 2%] e altimetrias inferiores a 3 metros. Além disso, o nível do lençol freático da cidade é muito raso, o que a torna muito suscetível a inundações provocadas pelo mar e alagamentos devido às chuvas intensas”, explicou Joseph Harari, professor do Instituto de Oceanografia (IO) da USP e participante do projeto.

Aumento de ressacas

Os impactos relacionados com a elevação do nível do mar, combinada com marés meteorológicas e astronômicas e eventos meteorológicos, já estão sendo sentidos em Santos há algumas décadas.

Um estudo realizado por Celia Regina de Gouveia Souza, pesquisadora do Instituto Geológico e participante do projeto, constatou que o número de ressacas registradas na cidade teve um salto a partir do final da década de 1990.

Em 2010, por exemplo, foram registrados na cidade 15 eventos de ressaca, contra um número máximo de 4 por ano entre 1960 e início dos anos de 1990.

A pior ressaca do mar na cidade foi registrada em 2005 e levou a prefeitura municipal a colocar um anteparo de pedra no final da Ponta da Praia [foto acima] – região que tem sofrido com erosão costeira acelerada (perda de faixa de praia) desde o começo da década de 1940, com a construção da avenida à beira-mar sobre a praia.

A ressaca do mar, segundo a pesquisadora, está associada com o desenvolvimento de ciclones extratropicais, formados no sul da América do Sul e que avançam pela região Sudeste do Brasil, gerando ondas de alta energia e sobrelevação do nível do mar (maré meteorológica positiva), além de frentes frias que podem trazer muita chuva nas regiões costeiras.

“A intensidade dos impactos gerados na orla pela conjugação dessas condições com a elevação atual do nível do mar está aumentando, mas ainda não sabemos se a magnitude dos eventos tem se modificado”, afirmou Gouveia.

A região noroeste da cidade, por exemplo – onde estão concentrados imóveis cujo valor venal é, em geral, inferior aos da Ponta da Praia e onde vivem cerca de 83 mil pessoas –, sofre periodicamente com inundações, provocadas por marés positivas e de sizígia, além de enchentes.

Já a região sudeste – onde estão situados os imóveis de padrão mais elevado na cidade e onde vivem cerca de 34 mil habitantes – é afetada por alagamentos, causados por chuvas fortes, mas principalmente pela erosão costeira, que vem se agravando muito na Ponta da Praia.

“Essas duas regiões têm padrões diferentes de uso e ocupação do solo, que geram vulnerabilidades e, portanto, danos e perdas também diferentes em relação às projeções de elevação do nível do mar”, explicou Souza.





Cálculo de perdas

Os pesquisadores estimaram os possíveis danos econômicos de inundações costeiras nas zonas sudeste e noroeste de Santos, causadas pela elevação do nível do mar nos diferentes cenários projetados para 2050 e 2100, combinadas com uma sobrelevação da maré em 1,6 metros em 2050 e 1,66 metro em 2100, provocada por um evento extremo com ocorrência de uma vez a cada 100 anos.

Para isso, eles usaram um software de geoprocessamento chamado COAST (sigla de Coastal Adaptation to Sea Level Rise Tool), desenvolvido por uma empresa americana.

O software mensura os potenciais danos em ativos imobiliários provocados por inundação costeira a partir de dados da elevação do nível do mar, de marés astronômicas e meteorológicas e dados espaciais georreferenciados, cruzados com o valor venal do terreno (a soma do que foi gasto na construção do imóvel com o valor estimado do terreno), fornecidos pela prefeitura.

As projeções indicaram que a zona sudeste da cidade deverá ser a mais impactada nos três diferentes cenários de elevação do nível do mar projetados para 2050 e 2100.

Se não for adotada nenhuma medida de adaptação para uma elevação do nível do mar em um metro até 2100 – em um cenário mais extremo –, os danos econômicos podem ser de R$ 1,3 bilhão na região sudeste e de R$ 483,8 milhões na zona noroeste, estimam os pesquisadores.

“O COAST e outros modelos matemáticos ainda não são capazes de estimar a resiliência e a resistência dos ambientes, como por exemplo, como uma praia responde a uma elevação do nível do mar, ou como um manguezal consegue retardar o avanço do mar sobre áreas estuarinas”, afirmou Souza.

“De qualquer forma, é preciso estudar e adotar medidas de adaptação para minimizar os possíveis impactos socioeconômicos”, ponderou.

Algumas das medidas de adaptação que estão sendo adotadas no mundo para enfrentar as inundações e a erosão costeira causadas pelo aumento do nível do mar são barreiras naturais, como faixas de manguezais, implementadas em Palm Beach, na Flórida; engordamento de praia, como feito em Cuba e Miami; diques flutuantes, adotados em Veneza, na Itália; e readequações nos projetos de casas e prédios, para torná-los mais resilientes ao avanço do mar, como feito em Hamburgo, na Alemanha.

Em Santos, os participantes do workshop discutiram e indicaram algumas medidas de adaptação mais viáveis para a cidade.

As propostas serão incorporadas ao sistema COAST e avaliadas pelos pesquisadores nos próximos dois meses.

As propostas mais indicadas para serem implementadas, em termos de custo e prazo, serão apresentadas em um workshop previsto para ocorrer no dia 1º de dezembro.

“A adaptação é um processo caro. Mas é muito mais custoso se não for feito nada”, avaliou Marengo.

Leia mais sobre o projeto:



Postado por @waasantista, a partir de Curitiba 
| Foto: @waasantista


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