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quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Tira-dúvidas sobre a Venezuela

Capitólio, na capital, Caracas (foto: WAA)
De Curitiba
Desde que voltei da Venezuela, com quem tenho conversado aqui no Brasil surgem alguns questionamentos recorrentes sobre a situação no país vizinho. Pra ajudar a esclarecer questões que parecem, pois, comuns, montei este modesto tira-dúvidas. As respostas são baseadas naquilo que constatei in loco durante a estada de uma semana por lá e também a partir do que ao longo do tempo venho acompanhando sobre a Revolução Bolivariana. Eis as perguntas e, em alguns casos, afirmações corriqueiras, com os respectivos comentários meus:

Chávez está vivo?
- Sim, não estive com ele, mas diversas pessoas estiveram, e não há razão para duvidar das afirmações do governo venezuelano, desmentindo boatos.

Está em coma induzido?
- Não, o governo venezuelano nega esses boatos, pessoas que visitaram o presidente também, e não há por que duvidar. Por que dar tanto crédito a notícias evidentemente especulativas?

Mas se não está realmente muito mal, por que o governo não é mais transparente, não divulga o boletim médico em detalhes, não mostra uma foto de Chávez no hospital?
- É preciso analisar o posicionamento do governo venezuelano dentro do contexto em que vive a Venezuela, não do nosso. Lá a oposição de direita é gulosamente golpista; encontra nas emissoras de televisão aliadas de primeira hora (uma delas foi protagonista do golpe de 2002). A ausência do presidente pode estimular manobras de golpe da direita e, quanto mais informações ela tiver - sejam sobre a gravidade ou sobre a melhora do estado de saúde de Chávez – podem servir de munição para que este anseio pelo golpe se torne uma tentativa prática.

Há ditadura na Venezuela?
- Só o desconhecimento, ou quem se informa apenas pela Globo, Veja e semelhantes, para achar que há ditadura na Venezuela. Há liberdade de expressão, não há censura (basta assistir às emissoras de televisão e ler os jornais expostos nas bancas; é a oposição descendo a lenha a todo instante no governo Chávez). O que existe lá é justamente a diversidade de manifestação. Em contraponto ao que dizem os meios de comunicação privados, há os meios oficiais e veículos comunitários. Repare: enquanto aqui os comentaristas da Globo, jornalões e revistonas emitem suas opiniões de direita, geralmente baseadas em especulações (o exemplo mais recente é a barriga do racionamento de energia),  sem que haja uma resposta mais efetiva do governo, da sua base ou do campo político mais progressista, na Venezuela o governo se posiciona firmemente; nas ruas, a população tem argumentos para defender a revolução bolivariana, argumentos esses que deixam a direita sem resposta. A direita se cala não porque não pode falar, sim porque não tem o que dizer.

Dizem que Caracas é muito violenta...
- A sensação de (in)segurança que se tem em Caracas é a mesma que se tem em Curitiba, São Paulo, Rio de Janeiro, Santos, Florianópolis, Porto Alegre, Salvador, Recife, Paris (lembrem-se que, neste ano, o reveillon foi adiado por medo de confusões), Nova Iorque (quem já foi lá conta: se afaste um pouco do centro nervoso para ver)... Como em todas essas cidades, deve-se estar atento, saber identificar os locais de maior risco, cuidar da bagagem etc etc.

Existem negócios, empreendimentos privados?
- Sim, a revolução bolivariana, a completar 14 anos, não confiscou nem impede os empreendimentos privados. Tem Mc Donalds, Burger King, Coca-Cola (na verdade notei predominância da Pepsi – até nisso me agradou a Venezuela, sempre preferi Pepsi); tem Nike, Adidas; tem shopping center. A diferença é que o cidadão tem a opção do produto e do empreendimento particular e, também, de produtos e negócios públicos, que cobram preço de custo. No Centro de Caracas, por exemplo, há a Tiendas Alba, magazine de roupas fabricadas nos países da Alternativa Bolivariana para as Américas; cafés e chocolatarias escoam a produção da agricultura familiar. Ou seja, a democracia é política (eleições, plebiscitos, referendos, liberdade de imprensa) e econômica (opções de grife, mais caras, e populares, mais em conta).

Os venezuelanos gostam muito de brasileiros
- É verdade e, talvez reflexo da revolução bolivariana, há um apreço por outros latino-americanos também. Não é, porém, o futebol o principal elo entre venezuelanos e brasileiros, como costuma ser em outros lugares, embora a expectativa de que a seleção Vino Tinto se classifique para disputar a Copa no Brasil esteja fazendo os venezuelanos ficarem mais atentos à modalidade (o beisebol e, num segundo plano, o basquete, são os preferidos). Lhes interessa saber de nós sobre as novelas, a música, o Lula, a Dilma, a Amazônia.

A gasolina é quase de graça 
- Não cheguei a conferir o preço na bomba, mas, na rota Manaus-Caracas, todos os testemunhos de brasileiros é de que o combustível é baratíssimo e de qualidade. No posto da PDVSA em Santa Helena de Uairén, na fronteira com Pacaraima (Roraima), a fila de carros com chapa brasileira, para abastecer, é gigantesca.

Energia elétrica e água também são baratas
- Principalmente nas paradas na rota Manaus-Caracas, os testemunhos são nesse sentido mesmo. Pequenos agricultores e empreendedores têm tarifas bastante reduzidas.

O país está em crise ou está crescendo?
- Não há crise, nem política, nem econômica. Há, sim, muito debate, muita discussão, discursos acalorados de parte a parte – isso nem é crise nem é instabilidade. A economia segue aquecida – movimento no comércio, grandes obras de infraestrutura em andamento... Incertezas, pela preocupação com o estado de saúde de Chávez, com um golpe de Estado da direita, há mas, ao mesmo tempo, há uma convicção popular de que nada abalará a perspectiva de continuidade da revolução bolivariana. E, no campo econômico, todo o planeta tem sofrido com a crise mundial – uns mais, outros menos, e é no grupo dos menos afetados que está a Venezuela (dados da Cepal, da OCDE corroboram isso).

Há miséria?
- Os dados mostram que ela se reduziu drasticamente com a Revolução Bolivariana, todavia 14 anos é pouco tempo para consertar 500 anos de colonização predatória e governos excludentes, elitistas. As favelas continuam na paisagem de Caracas, mas as missões (educação, saúde, moradia) melhoraram sobremaneira a qualidade de vida das pessoas, propiciaram oportunidades. No Centro de Caracas, diversos edifícios foram e estão sendo erguidos para abrigar quem vivia ou vive em condições indignas de habitação. E um detalhe: em quase uma semana andando pelas ruas de Caracas não vi um morador de rua sequer, tampouco fui abordado por sequer um pedinte. Não estou afirmando que não possa ter, mas certamente são em proporção inferior ao que se vê em Curitiba, Santos, São Paulo, Rio, Paris, Nova Iorque...

É isso. Se alguém tiver uma dúvida  mais, é só escrever: waajornalista@gmail.com. Ah, em tempo: com tempo, em breve posto fotos no flickr.

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